20 de jan. de 2010

Miragem do Porto - Lenine


Eu sou aquele navio
no mar sem rumo e sem dono.
Tenho a miragem do porto
pra reconfortar meu sono,
e flutuar sobre as águas
da maré do abandono
Ê lá no mar
Eu vi uma maravilha.
Vi o rosto de uma ilha
Numa noite de luar
Êta luar
Lumiou meu navio,
Quem vai lá no mar bravio
Não sabe o que vai achar
E sou a ilha deserta
Onde ninguém quer chegar.
Lendo a rota das estrelas,
na imensidão do mar
chorando por um navio
ai, ai, ui, ui
Que passou sem lhe avistar.

14 de jan. de 2010

Fita Cassete




“E ele temia, antecipadamente, debruçado na cama, meia noite e cinquenta, exato, a fita rolando dentro do som, que quase ter vinte e um era assustador.
Incomodava feito aquele barulho agudo de silêncio que, às vezes, dá no ouvido.
A cabeça já doendo e tentando lembrar aonde enfiou a cartela de dramin que toma, às vezes, só às vezes, para dormir.
Ligava a televisão e mais uma vez constatava o quanto odiava o José Luíz Datena.

Ficava deveras assustado com o fato de que o tempo não descansa para tomar um café e que ele era efêmero, como o resto de toda a bosta do mundo.
E era estranho saber que amanhã acordaria e que dormiria de noite para novamente acordar até, quem sabe, se deus quiser, se passar mais vinte e um anos e ele, debruçado na sua cama, talvez meia noite e cinquenta, a fita velha rolando dentro do so...Tác.
O lado A da fita termina e ele aproveita que já estava levantando e coloca a água para ferver. Enquanto lava as suas mão (como quem lava o passado) decide se café ou chá?
Vira a fita cassete e dá play, mais uma vez, feito uma música no repeat, en-jo-ativa”

Eis uma época boa, a época das fitas k7, dos discos de vinil, aqueles bichos pretos que funcionavam com uma agulha correndo os sulcos.Ah, você gosta de mp3, da tecnologia. Eu também gosto. Gosto de sentar na cadeira, entrar na net e mandar buscar “Motherfucker Satanic Of The Gold Islands Of Cerro Corá”. Pode digitar, vai aparecer uma banda de Papua Nova Guiné inspirada nas andanças de Lampião pela região do Seridó. Isso é a tecnologia, a globalização. Eu prefiro buscar banda de Garage, roots!
Eu gosto da tecnologia, gosto das facilidades, mas ainda não inventaram a cerveja virtual, os garçons do Bar do Vinnil virtual, muito menos o pastel de Frango e de Palmito com Guarapan virtual. No dia que inventarem tudo isso, estou feito. A tecnologia é boa para descobrir coisa novas, facilitar acesso, baixar custos, diminuir distâncias. Mas e o contato entre os interlocutores (não venha me dizer para usar a webcam) ? E a cerveja quase gelada acompanhada daquele som do Bob Marley na vanranda do sua casa? Hoje as pessoas estão ficando confinadas se relacionando via msn, orkut e demais facilidades. E a descoberta de um disco de vinil comprado na Feira de Discos compartilhada com um amigo? Pois é, antes era assim. Um comprava um disco e chamava outro para escutar, nisso ele sacava do bolso uma fita cassete Basf ou TDK e já gravava o disco. Ia para casa feliz da vida escutar sua fita. Hoje ainda tem quem grave discos de vinil, geralmente compactos, e ainda tem quem grave e lance material novo em fitas k7. Mentira? O Frattelli está querendo lançar. Esses são considerados quase, ou totalmente, loucos.
Muitas bandas sentem tremenda paixão por equipamentos antigos. Vintage. Dizem que proporcionam uma sonoridade diferente, mais sensível, mais crua. É a mesma coisa que dizem os que gostam de vinil em detrimento do mp3, que o som tem mais qualidade. Isso é verdade, já foi comprovado que o mp3 comprime a música de modo que a qualidade cai. E já anunciaram a morte do cd e o surgimento de um novo disco que ganha mais qualidade. Mas como disseram que os discos de vinil tinham acabado e eles teimam em continuar perambulando pelas vitrolas da vida… É esperar para ver.
Acho que todo esse apego pelo passado tem a ver com a aproximação que as coisas antigas traziam, e trazem, às pessoas. As bicicletas levavam as praças, lá tinham quadras, brinquedos, outras crianças, interação, brigas, risos. Hoje temos condomínios fechados, video-games ultramodernos, parquinhos em shopping centers. A música e o vídeo foram banalizados, como a amizade, como a vida. O livro ainda não. Na verdade o livro foi e é um marginal. Tem gente que parece com livro, outras pessoas parecem um pen-drive. Hoje não se vive, se sobrevive. Quase todos estão preocupados em ouvir, não em sentir a música. Será que sempre foi assim? É a nostalgia, dos amigos que chegavam com Camisa de Vênus, Ultraje a Rigor , Mundo Livre S/A, Ratos de Porão, Chico Science e Nação Zumbi, Gangrena Gasosa (uma banda onde os integrantes tocavam vestidos de entidades de Candomblé). Tudo se foi. Hoje qualquer banda que surge passa por Natal. Temos dois excelentes festivais de porte nacional, as bandas não lançam mais os discos nas caixinhas, com encartes, agora é virtual. Como sentir um encarte emborrachado como o do segundo CD de Otto (Condom Black)? Entendeu o trocadinho com o nome e com o material do encarte? Não? Em compensação, hoje não precisamos esperar a Bizz chegar as bancas para sabermos as novidades musicais. Também há a possibilidade de ter acesso a discos que nunca acharíamos como o da banda The Makers que faz um garage rock passando pelo Blues, Rockabilly e Psychobilly. Os milhões de blogs espalhados nos proporcionam baixar discos, filmes, nos informar. Em que revista você poderia ler um texto e escutar um disco?
E agora? O que fazer perdido em meio a nostalgia e a evolução inevitável? Convidar os amigos para tomar uma escutando o disco remasterizado com faixas bônus e video-clipe.


Texto não sei de quem ( ctrl +c) com algumas alterações minhas, achado por aí, neste mundo virtual que mistura realidade com ficção, verdade e mentira, passado com futuro e que a Fita Cassete sempre está presente , mesmo que for em um artigo qualquer.



Joyce Smarts